A coisa

Tem uma forma tridimensional. Um poliedro, composto de vários retângulos. Pesa aproximadamente 500 g. Tem dois lado planos e quatro lados abaulados. Qualquer lado te recebe, te aceita. Está sempre aberto para novas ideias. É rígido e tem uma simplicidade que me atrai. É calmo e paciente. Dialoga com firmeza, mas com doçura. Se for jogado na água afunda, devido à sua densidade. Se lixar muito fica liso e pode até desaparecer. É pau para toda obra. Ipê. Serve para apoiar as mão de uma pessoa em sentido invertido. É bem rígido. Sua cor é marrom claro. Para pregá-lo deve-se utilizar parafuso, pois não aceita prego com facilidade. Aguenta tudo, sempre disposto a dar apoio. Para ser colado recomenda-se utilizar cola branca. Não tem coração. Precisa de um tratamento contra pragas. Não é único e pode ser reproduzido facilmente, embora não seja fácil de encontrar e não seja vendido em lojas. Por sorte, não precisa afirmar a sua existência. Não gosta muito de falar, mas escuta tudo como um amigo atencioso ou um psicanalista que te acolhe, te recebe, absorve tudo o que você tiver para dar e no final sorri. Inerte, só se move por impulsão. 

Inércia

Fico pensando e observando as coisas, todas aquelas que habitam os espaços, as grandes e as pequenas, a geladeira, o alfinete ou uma almofada. Você já reparou na mania que elas tem de ficar ali paradas naquela inércia profunda? Aquela tarrachinha de brinco que cai no canto escondido da parede, ela fica lá parada esperando. 

Fico imaginando se de repente elas se mexessem...

Que medo...

Bjork e a televisão

As coisas estão aí. Um pouco mais ou menos presentes do que o necessário, com ou sem utilidade. O que sobra no mundo vira matéria de poesia. 
 

Tem um certo orgulho em quem diz que não guarda coisas que não servem, que faz uma limpa mensal, que não suporta tranqueiras. Orgulho de só ter o necessário, o útil, mesmo que o maior esforço atual seja nos convencer da utilidade de certas coisas. Todas essas coisas as quais não podemos viver sem. Impossível não considerar a importância e utilidade de uma televisão. 

Você não deveria deixar os poetas mentirem pra você.

MANIFESTO COISISTA

Brasília, 27 de março de 2016

 

Elegemos Manuel de Barros como nosso poeta magno, o apóstolo único do movimento coisista, o nosso manual.

 

1.     Nós queremos glorificar as coisas em detrimento do homem.  A espontaneidade da inércia será um elemento essencial da nossa poesia

2.     O circo evidenciou até hoje a proeza, a força e a flexibilidade dos corpos humanos. Nós queremos protagonizar o movimento incerto, autônomo e arriscado dos objetos

3.     Nós afirmamos o que o antropocentrismo cênico ignorou até hoje: não há mais beleza em um mundo que ignora as coisas que aí estão. A força poética de uma coisa deve ser reverenciado no palco

4.     É preciso sentir o movimento latente na imobilidade das coisas. O extraordinário do mundo se enriquece de uma nova beleza: a beleza da presença inerte do não movimento e do movimento passivos dos objetos em risco de descarte.

Sobre emoções

Consiste em trazer a tona o desejo e deixa-lo guiar no pouco tempo que se tem. A composição é simples, a vontade de mexer, o que tiver ao seu alcance, a soma das coisas que te movem. Sair da inércia e seguir um impulso, o medo é grande, me faltam mecanismos. O medo é grande mas já não me basta sigo movendo só tenho medo da inércia o resto é movimento. 

(MATÉRIA DE POESIA)

todas as coisas cujos valores podem ser

disputados no cuspe a distância

servem para poesia.

Um homem que possui um pente

e uma árvore

serve para poesia

Terreno de 10x20, sujo de mato - os que

nele gorjeiam, detritos semoventes, latas

servem para poesia.

Um chevrolé gosmento

coleção de besouros abstêmios

O bule de Braque sem boca

são bons para poesia.

As coisas que não levam a nada

têm grande importância

Cada coisa ordinária é um elemento de estima.

O que se encontra em ninho de joão ferreira,

caco de vidro, garampos,

retratos de formatura, servem demais para poesia.

Tudo aquilo que nos leva a coisa nenhuma

e que voce não pode vender no mercado

como, por exemplo, o coração verde

dos pássaros

serve como poesia.

(Manuel de Barros).

Tirinhas de Lucas Gehre

 

todos os ensaios antes de hoje e hoje

[antes do carnaval]

Geringonça, engenhoca, traquitana.

Elemento imprevisível. Como dominar o aleatório, inesperado? > Risco. (desenvolver)

Corpo presente. conexão pela respiração, movimentação do ar. Abrir os poros.

Composição > sequência de acontecimentos que se desencadeiam em movimentos (maquete, desenho, etc)

Tensão entre corpos: corpo presente [PRESENÇA]

jogo ativo> pesquisar sobre isso

Porque simplificar se você pode complicar?

>um fim inútil

 

[sábado de carnaval]

corpo machucado

desfalque

estética do risco - "do corpo sacrificado ao corpo abandonado" > relacionar com o texto.

 

Goldberg Machine:

Escada --------------------------------------------------------------> garrafa d'água rolando (4 bebem)

 

[quinta-feira, grupo de estudos]

risco simbólico X risco real

vida em cena, morte convocada

 

* aprendizado do risco> descoberta: exploração do desequilíbrio. limite. controle, repetição

dominio: situações estáveis - ruptura. perigo=circo

hiperespecialização: virtuose: + improvisação e adaptação

* estética do risco - expressão pelo desequilíbrio

 

* composição da obra

grau de fragmentação do espetáculo

índice de estabilidade/equlíbrio

dramaturgia (teatral?)

*alternância entre estável/instável > estrutura cíclica do espaço e do tempo (dramaturgia do circo)

*arte do lixo

 

[reunião com o luiz]

sobre a ineficiência no mundo industrial, onde as máquinas foram criadas para substituir o ser humano, por serem mais eficientes.

Nesse sentido, as geringonças são uma ode ao ser humano.

sobre a inutilidade na sociedade de consumo. máquinas criadas para criar uma necessidade.

 

Prefiro as máquinas que servem para não funcionar:

quando cheias de areia de formiga e musgo - elas

podem um dia milagrar de flores.

(Os objetos sem função têm muito apego pelo abandono.)

Também as latrinas desprezadas que servem para ter

grilos dentro - elas podem um dia milagrar violetas.

(Eu sou beato em violetas.)

Todas as coisas apropriadas ao abandono me religam a Deus.

Senhor, eu tenho orgulho do imprestável!

(O abandono me protege.)

Manoel de Barros

 

Nesse sentido as geringonças não são desejadas, não atendem a nenhum anseio.

 

[quinta-feira]

corpo abandonado

(fotos)

[ensaio de terça que virou reunião]

o que fazer com tudo isso
 

[quinta, grupo de estudos]

> narrativas - linear ou não

acidentes

acaso no processo criativo

 

[sexta, sobre o ritmo]

[sábado, sobre a precisão]

precisão, segundo o google

substantivo feminino

1. falta de algo necessário ou útil. "tem p. de mantimentos"

2. necessidade imediata; urgência.

[terça-feira]

Levar objetos e apresentá-los. Tentei conectar, de alguma forma, com o trabalho de ritmo e dança que estamos desenvolvendo.

 

[sexta-feira, primeira semana de março]

composição > interação da geringonça com a figura humana

As coisas
Arnaldo Antunes / Gilberto Gil

As coisas têm peso, 
massa, volume, tamanho, 
tempo, forma, cor, 
posição, textura, du-ração, 
densidade, cheiro, valor.
Consistência, pro-fundi-dade,
contorno, temperatura,
função, aparência, preço,
destino, idade, sentido. 
As coisas não têm paz.

 

Interação com o objeto, ser parte da máquina, engrenagem. O corpo como parte de um mecanismo inútil. Parte útil de um mecanismo inútil. Mecânica do corpo. Objeto como parte do corpo, orgânico. Implante.

[hoje]

reunindo todas as ideias > dança, manipulação de gente, manipulação objeto, jogo, ritmo

concentração

cuidado com o objeto, cuidado com a manipulação, cuidado com as transições.

ser máquina. funcionar.

começamos (ou primeiro dia da metade do processo)

Na verdade começamos em fevereiro, mas as ideias estavam fervilhando na sala de ensaio e só agora chegamos aqui. Entre pesquisas de caminhos, possibilidades e referências, chegamos em algumas palavras-chave que estão nos guiando na pesquisa. 

Inauguro aqui esse espaço coletivo de registro e troca de ideias, referencias e inspirações ao longo do processo. Vamos juntos?